Processo de produção de cerveja artesanal

Na coluna de hoje faremos um resumo sobre o processo de produção da cerveja, que envolve a definição do estilo, elaboração da receita, seleção dos insumos e moagem do malte, mosturação, clarificação, fervura, resfriamento, fermentação, maturação e envase.

Definição do estilo e elaboração da receita

O primeiro passo da produção é a definição do estilo de cerveja a ser produzida. A partir daí, inicia-se elaboração da receita com base nas características presentes no estilo. Os parâmetros, que definem a cerveja são basicamente as estimativas de densidade inicial e final, teor alcoólico, cor e amargor, constituindo o projeto da cerveja.

As principais referências para definição dos estilos são o Beer Judge Certificate Program (BJCP) e o Brewers Association. O BJCP é um programa de uma instituição norte-americana que descreve as características e parâmetros de vários estilos de cerveja. O Brewers Association, é uma associação norte-americana de cervejeiros, que também possui uma lista com os estilos e suas características e possui atualizações mais constantes dos estilos. Ambos são utilizados como referência na avaliação de cervejas em concursos internacionais, como o European Beer Star, Australian Beer Awards ou South Beer Cup.

Seleção e Moagem do malte

A seleção e moagem do malte são etapas essenciais no processo de produção. O malte deve ser cuidadosamente moído, de modo a ter apenas a casca “quebrada”, para facilitar a extração de amido e das proteínas. A figura abaixo demonstra o malte moído.

Foto 1: Malte moído

Mosturação

O processo de mosturação consiste em misturar o malte moído à água aquecida em temperatura controlada. Nesse momento o malte é hidratado e as enzimas ativadas, permitindo a conversão de amido em açúcares fermentáveis e proteínas em nutrientes. Durante a mosturação, as amilases α e ß atuam hidrolizando o amido e a amilipectina para liberar os açúcares fermentáveis.

O tempo de mosturação geralmente varia de 60 e 90 minutos em temperaturas que variam de 62°C a 72°C, dependendo do estilo da cerveja. Existem ainda, rampas de temperatura que podem ser utilizadas para ativas enzimas específicas, conforme demonstrado na tabela 1. O mais comum é utilizar essas rampas quando são adicionados cereais não maltados. Ao final dos 90 minutos, a temperatura do mosto é elevada a 76°C, num processo conhecido como mash out. Essa elevação da temperatura facilita o processo de filtragem e gera a inativação das enzimas.

Tabela 1: Temperatura de ativação das enzimas e suas funções

Recirculação/clarificação e lavagem

Após elevar a temperatura a 76°C, o mosto deve ser filtrado através de um processo de recirculação ou clarificação, importante para tornar a cerveja mais límpida e com menos impurezas. Esse processo geralmente é bastante lento, mas considerado essencial para a qualidade final.

Após a clarificação, quando o mosto já se encontra límpido, inicia-se o processo de lavagem, onde os açúcares residuais do malte são extraídos a uma temperatura de 80°C. Após a lavagem do malte, todo o mosto é transferido para a tina de fervura.

Fervura

A fervura é o processo onde ocorre a caramelização de açúcares e esterilização do mosto. Nessa etapa são adicionados os lúpulos e inativadas as amilases e proteases que se precipitam em flocos formando um “bolo” chamado trub.

A fervura pode ser mais ou menos vigorosa e variar de 60 a 120 minutos. Uma fervura longa e mais vigorosa aumenta a evaporação, porém ajuda a decantar as partículas no processo de resfriamento, melhorando a clarificação da cerveja.

Durante a fervura são adicionados os lúpulos de amargor, geralmente 60 minutos antes do término da fervura. Já os lúpulos aromáticos devem ser acrescidos a partir dos 15 minutos finais da fervura, evitando a volatilização de aromas, mantendo-os na cerveja. Podem ser feitas uma ou mais adições.

Ao final da fervura é feito o whirpool, um processo semelhante à centrifugação, onde o mosto é movimentado de forma circular e convexa. Isso faz com que o trub se tenha um assentamento regular e se concentre no centro da tina, evitando a transferência de partículas indesejadas para o fermentador.

Resfriamento

O resfriamento ocorre o mais rapidamente possível, diminuindo assim, às possibilidades de contaminação.

O mosto é transferido a uma temperatura adequada ao tipo de fermentação desejada, para que a levedura possa ser acrescida sem causar variações extremas de temperatura. As faixas ideais de temperatura são entre 8ºC a 15ºC para as cervejas tipo lager e 15ºC a 23ºC para cervejas tipo ale.

São exemplos de cervejas tipo Lager: Pilsen, Bock, Rauchbier, Schwarzbier

São exemplos de cerveja tipo Ale: Weiss, Pale Ale, Blond Ale, Tripel

Fermentação

As fermentações “Ale” (de alta fermentação) duram de 5 a 10 dias e trabalham a temperaturas de 15 a 23ºC. As fermentações “Lager” (de baixa fermentação) geralmente são mais longas, com uma temperatura de fermentação inicial de 8ºC a 15ºC. A fermentação ocorre em temperatura controlada.

Foto 2: Fermentador cônico de inox com controle de temperatura

O controle de temperatura é essencial para a cerveja. Em temperaturas elevadas são produzidos níveis excessivos de diacetil, podendo gerar sabores desagradáveis na cerveja. Temperaturas muito baixas também podem comprometer os ciclos da fermentação, adaptação, atenuação e acondicionamento, ou maturação.

Maturação

A maturação consiste em armazenar a cerveja em baixas temperaturas. Essa etapa é fundamental para que a cerveja atinja o seu equilíbrio. Ocorre a saturação do CO2, a clarificação através da decantação de partículas e resíduos da fermentação e maturação dos compostos que conferem à cerveja o aroma e sabor.

Ao iniciar-se essa etapa, a maior parte dos açúcares foi metabolizada em álcool etílico, gás carbônico, glicerol, ácido acético e álcoois superiores.

Tecnicamente, na maturação ocorre uma redução na concentração de ácido sulfídrico, de acetaldeído e de diacetil. Esses compostos são subprodutos resultantes da fermentação.

A cerveja pode ser envasada em latas de alumínio, garrafas ou barris.

As cervejas podem ainda passar por um processo de filtração e pasteurização visando garantir maior estabilidade e tempo de prateleira ao produto. Entretanto, esses processos tendem a diminuir as características organolépticas da cerveja.

Na próxima coluna, falaremos sobre uma das principais escolas cervejeiras: Alemanha.

Filipe Corrêa da Costa, cervejeiro e proprietário da Cerveja Sambaqui

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